Fundação Maitreya
 
Farid

de Spiritus Site

em 18 Jun 2007

  As palavras e proezas dos santos orientais, inclusive os da ordem sufi, constituem um alicerce importante do folclore indiano. Pelo exemplo das suas vidas. Esses mestres iluminados irradiaram um lustre espiritual entre os seus contemporâneos e as gerações sucessivas, e inspiraram gente a buscar o auto-conhecimento, tornarem-se melhores seres humanos e orientaram os seus passos no caminho de Deus. Estes santos abnegados, também opuseram a ortodoxia formal, a estreiteza do espírito e o sectarismo, e promoveram o humanismo e o secularismo por via das mensagens contidas nos seus hinos e poemas filosóficos, que compuseram na linguagem do povo nas épocas em que viveram.

Um venerado santo e poeta sufi

Um destes santos-poetas sufis que atingiu a iluminação espiritual e ganhou grande fama e reverência, particularmente na região do Punjab, Delhi e outras zonas do norte da Índia, foi o assim chamado Baba Xeque Farid ou Hazrat Farid “Shakkarganj”, cujo verdadeiro nome era Fariduddin Masud. Nasceu em 1173 d.C., na aldeia de Kothwal (mais tarde conhecida por Chawali Mashaikh, isto é, Terra do Santo) perto a Multan (um distrito da Índia antes da Partição que hoje em dia situa-se no Paquistão). Desde a sua infância, o santo ficou conhecido pela primeira parte do seu nome, Farid, que significa “único”.
Enquanto ainda muito jovem, o pai de Farid, Jamaluddin Sulaiman, morreu e o rapaz foi iniciado na sua orientação religiosa pela mãe. Qarsum Bibi, que era uma senhora muito pia. Para encorajar a criança a dizer as suas orações regularmente, ela deixava uma embalagem de shakkar (açúcar) debaixo do seu tapete de oração como um prémio por ter dito as rezas. Uma vez, esqueceu-se de deixar o açúcar. Todavia, Farid encontrou uma embalagem de açúcar na mesma no lugar habitual. Este milagre resultou na sua apelação popular, Gonj-e-Shakkar ou Shakkar ganj (o tesouro da doçura), que ficou como sufixo ao seu nome. Este título honorífico também tinha uma conotação metafórica porque os versos compostos por ele, que personificavam os seus ensinos, cantados à música dos raagas (música clássica indiana do estilo hindustani) eram particularmente doces.

Farid era um dos fundadores da famosa Ordem (silsila) Sufista dos Chisti, que nasceu quando o grande santo Khwaja Muinuddin Chisti, também conhecido como o Khwaja Gharib- Nawaz (que significa “quem acolhe os humildes”) chegou à Índia ao fim do século XII. (Ver Viagem a Ajmer). O santuário dargah do Khwaja na cidade de Ajmer no Rājasthan ainda hoje é o mais famoso centro de peregrinação muçulmano na Índia. A palavra Suf em árabe quer dizer “lã”, e os sufis eram ascetas que vestiam roupas de lã. Com o seu espírito de renúncia, estes homens extremamente piedosos meticulosamente evitaram os confortos quotidianos e afastaram-se dos ricos e poderosos. De acordo com essas tradições da sua seita, Farid viveu uma vida simples de auto-abenegação e continuou a sua procura para Deus e auto-realização. Num dos seus versos, descreveu-se como um dervish envolvido num lençol de lã. A sua austeridade simbolizou no provérbio em persa “barg-e sabz as tohfa- e-darves” (uma folha verde é a dádiva do asceta).
Farid tornou-se num discípulo de Khwaja Qutbuddin Bakhtiyar Kaki Ushi, que atingiu tamanha fama na história de Delhi que o então sultão Qutb-ud-din Aibak começou a construir a famosa Qutb Minar (uma torre) e a mesquita de Qutb em sua honra. Ambos estes edifícios foram completados mais tarde pelo sucessor do sultão, Altamash, também conhecido por Iltutmish. Depois de ter permanecido durante algum tempo com o seu mestre espiritual em Delhi, Farid estabeleceu um centro em Hansi (Haryana), onde viveu mais de uma década.
Em seguida, segundo as instruções do seu mestre de estabelecer uma povoação nos baldios, Farid escolheu o sítio de Ajodhan, nas margens dum afluente do rio Sutlej. O lugar, hoje em dia no distrito de Montgomery (rebaptizado Sahiwal) do Punjab (do Paquistão) é uma vila próspera. Um barco atravessa o rio levando passageiros e carga. Chamava-se Pattan. Mais tarde, em honra do seque Farid que o santificou, ficou conhecido como Pak Pattan (o barco santo).

Farid era um erudito dotado nos estudos islâmicos e foi educado em vários ramos de teologia em Delhy e Multan. Devido aos seus profundos conhecimentos foi honrado com a alcunha Seque-ul-islam (o supremo divino do Islão). Também era o mestre espiritual do famoso xeque Nizamuddin Auliya de Delhy, cujo santuário é visitado por inumeráveis muçulmanos e indivíduos de outras seitas e terras que o honram e onde durante uma semana se realiza um urs ou congregação comemorativa todos os anos no dia do seu aniversário.
Os ślokas (hinos e outros versos) de Farid foram transmitidos oralmente de uma geração à outra, até Guru Nanāk, o fundador da religião dos sikhs escolheu e cuidadosamente conservou 134 deles e passou-os ao Guru Angad. Foram incorporados no Aadi Granth, as escrituras dos sikhs, por Guru Arjun Dev em 1604 d.C. e, assim, ficaram santificados e imortalizados como baani, as escrituras sagradas dos sikhs. Os versos de Farid e uma dúzia de outros bardos e santos hindus e muçulmanos da Índia pertencentes à época antes de Guru Nanāk foram incluídos no Guru Granth Sahib porque enfatizaram os mesmos aspectos da vida espiritual que os gurus queriam que os sikhs inculcassem. A inclusão destes versos nas escrituras dos sikhs também mostra que os gurus dos sikhs atribuíram muito respeito a todas as principais religiões.

Os seguidores e admiradores de Farid encontram-se por todo o sub--continente indiano. A sua poesia, que escreveu principalmente na sua língua materna, Punjabi, no dialecto de Multan é cheia de misticismo e trata dos assuntos do corpo e da alma. Escrevia na linguagem popular em vez de em árabe e persa, as línguas dos eruditos. Numa idade assolada por ódio e rancor, trouxe uma mensagem de paz, boa vontade, humanismo e secularismo. A sua mensagem chama a atenção ainda hoje do coração dos homens do nosso tempo, absorvidos pelo materialismo e cinismo. A essência da filosofia de Farid reflecte-se num provérbio em persa, “Dil badast aawar keh haj-e-akbar ast” (Controle o seu coração, porque essa é a maior peregrinação). De facto, era o epítome da espiritualidade, que apoiou o universalismo, abraçou toda a humanidade e transcendeu os estreitos limites de religião e região.
Farid morreu em 1265 d.C. com a venerável idade de noventa e dois anos, depois de ter acabado as suas orações com grande devoção a Deus. Transformou-se numa instituição lendária mesmo durante a sua própria vida. Foi honrado por cento e um nomes diferentes, cada um dos quais significava uma característica especial ou um aspecto da sua extraordinária personalidade espiritual.

O Xeque Farid disse:
“Senhor procuro abrigo contigo; és o único que pode dar perdão. Concede ao Farid a caridade da tua devoção”.

“Farid, o amor de Deus e a avidez não são compatíveis. Com avidez o amor é impuro. Um amor destes é frágil como um tecto de palha cheio de buracos contra a chuva”.

“Que as tuas palavras sejam sempre verdadeiras e puras. Abandona tudo que seja falso. Que o discípulo siga o caminho do mestre”.

“Farid, imaginei que somente eu era infeliz; Vê, todo o mundo está nos braços da miséria; Vi isso do telhado da minha casa. O fogo não poupou nenhuma casa”.

“Farid, se és sábio, não falas mal de ninguém. Olha dentro de ti próprio, e encontrarás tudo que é mau aí”.

Por Cortesia da Revista India Perspectives.
   


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