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O Yoga Vāsiṣṭha de Vālmīki
de Alejandro Corniero em 13 Mai 2012 ![]() Nestes extractos seleccionados que passaremos a apresentar por capítulos encontram-se ensinamentos do Yoga tradicionais como são ensinados e postos em prática pelas mais altas autoridades espirituais da Índia. Trata-se de uma jóia de espiritualidade e sabedoria que apresenta as noções fundamentais do Vedānta numa forma mais exequível do que os tratados de estilo mais filosófico, sem perder, contudo, o que tem de elevado e de profundo. Os sábios antigos eram da opinião de que, quem estuda com atenção esta obra, e vive os seus ensinamentos, se eleva acima das limitações da matéria e, experimentando uma beatitude imutável no seu ser, leva os seus semelhantes a participar da sua própria exaltação espiritual, através da bondade e da verdadeira filantropia. 1ª Palestra Quando o santo e sábio Vasiṣṭha, com hábito amarelo e levemente inclinado, fez a sua entrada, às seis da manhã, na assembleia real, o soberano e seus ministros levantaram-se e, todos de pé, exclamaram: “OM! Namo Nārayanaya, Mahātma!”(1) O santo Ṛṣi(2) abençoou-os e, ocupando o assento mais elevado, começou a falar dirigindo-se ao príncipe Rāma: «Qualquer que seja a companhia com que possa encontrar-se ao cumprir os deveres da vida, o homem sábio controla os movimentos da sua alma. Não deve ser absorvido pelas preocupações do mundo nem ocupar-se de pensamentos das coisas desta vida. Não se deve deixar a alma errar pelo extenso âmbito dos prazeres exteriores, nem apegar-se aos objectos e acções dos sentidos. Deve repousar unicamente em buddhi(3) sem se deliciar com coisa alguma, que não a sua própria delícia. O homem sábio permanece concentrado por completo em si mesmo, e a sua tranquilidade de espírito é comparável à firmeza do topo do Himālaya, imutável em todo o tempo e em qualquer estação. Um estado de alma assim alcança a maturidade com o tempo e adquire-se com uma prática constante do Yoga(4) e com o serviço ao Mestre. Então o yogī liberta-se tanto do sofrimento como do medo e supera as ilusões e aflições do mundo; não teme perder esse estado. Quem tiver alcançado esse objectivo aparta-se, com riso e desprezo, da turbulenta esfera da terra, como alguém que, desde uma cúspide, observa sorridente os objectos situados abaixo. Ó Rāma, os mestres do Yoga Adhyatma(5) afirmam que um dos meios mais fáceis para alcançar esse estado é a suprema adoração a Deus, assim como o Yoga. Ó Rāma, tu conheceste a verdade – ao saber que é Deus quem governa o mundo – e compreendeste a Natureza divina na totalidade do seu triplo estado(6) . Assim como não vês no oceano senão uma única e vasta substância, a água, tão pouco distingues no império do universo senão o Senhor Universal. Assim como a percepção de uma flor é acompanhada da percepção do seu perfume, do mesmo modo o conhecimento de Ātman(7) é inseparável do conhecimento da alma. Tal como num espelho não se vê mais do que uma parte dos céus que tudo cobrem, também o omnipresente Ātman não pode ser percebido mais que numa parcela, no espelho da alma. O Espírito Supremo, ilimitado no tempo e no espaço, dá a Si mesmo, por sua vontade própria e em virtude da sua omnipotência, as formas limitadas do tempo e do espaço. Sabe que o mundo nada tem de substancial, ainda que o possa parecer; não é mais que vazio, somente uma aparência criada pelas imagens e fantasias da alma. Sabe que o mundo é um teatro de sortilégios procedente da magia de māyā(8). Este mundo todo é Brahman(9). O que existe fora dele? De onde poderia vir isso? De onde encontraria o lugar? O mundo é criação do erro e ídolo dos insensatos. Remove todo o desejo falacioso e todo o pensamento, ó Rāma, ó filho bem-amado, e recorda o teu sempre luminoso Ātman». Rāma reflectiu nas palavras do santo instrutor. «O que significa esta peregrinação que fazemos no mundo?», pensou, «e porque é que todos os seres humanos e animais se vêm forçados a entrar e sair do cenário deste teatro evanescente que é a vida? Qual é a natureza da nossa alma e como deve governar-se? O que é este māyā do universo? Qual é a sua origem e como poderemos enga Os nossos corações a e as nossas almas são os que tendem a revelar o mundo fenoménico perante nós, e desta existência irreal, fazemos a realidade. Todas estas coisas estão entrelaçadas entre si nas nossas almas, e esfumam-se sempre que os nossos apetites mentais diminuem. A débil luz da razão vê-se eclipsada pelas nuvens sombrias das paixões e cobiças. Como poderei, pois, distinguir o verdadeiro do falso? Por um lado a alma conduz-nos ao conhecimento espiritual, e por outra, desvia-nos para a mundanidade. Quando se acalmarão definitivamente as minhas ansiedades? Quando finalizarão as minhas inquietudes? Quando possuirá a minha alma a sua santidade? Quando é que o seu voo deterá o meu capricho para se concentrar na Verdade interior? Quando se absorverá a minha alma no Espírito Supremo, tal como uma onda agitada se apazigua no seio da calmaria do mar? Para quando a luz da razão dissipará esta nuvem sombria de ignorância que envolve a minha Essência divina com o véu desta lamentável forma? Tenho de reflectir nos ensinamentos do bem-aventurado Sábio e depois sobre a conduta que deve seguir todo aquele que aspira à libertação(12). Quero praticar a virtude, quero participar em Satsangs(13) com uma intenção pura, e servir ao meu Instrutor. Tenho de ter ouvidos surdos para tudo o que não seja divino; tenho de viver na prece e na prática da meditação». Notas 1. «Saudações a Deus, Senhor de todas as coisas! Ó grande alma» 2. Sábio que realizou Deus; alma perfeita o que alcançou o conhecimento da sua própria divindade 3. Faculdade de descriminação ou razão intuitiva. Aspecto superior da inteligência por oposição à alma inferior (manas) 4. Yoga aqui significa uma via – que tem como meta o conhecimento ou a iluminação – que consiste em ser discípulo sob a autoridade de um Mestre tradicional. Os quatro aspectos desta via do Yoga são: I - Estudo da sua doutrina espiritual com exame de consciência e autocontrole II- Prática da meditação segundo o método tradicional recebido III- Serviço ao Mestre espiritual IV- Vida de acordo com os preceitos religiosos (dharma) guiada conscientemente para a honestidade, a virtude, a bondade e a humildade, sempre tendo o cuidado de não prejudicar nenhuma criatura viva. 5. Literalmente,” o Yoga que se refere ao Se”. A sua base metafísica é não dualista (advaita) e o seu maior representante e comentador foi Sri Shankarachārya. 6. Diz-se que a natureza (Prakṛtī) é composta na sua totalidade por três qualidades fundamentais (guṇas), que são sattva (luz, harmonia), rajás (paixão, actividade), e tamas (obscuridade, inércia). 7. O verdadeiro “Se/Eu”; o Espírito imortal e imutável do homem. 8. O poder creador e auto condicionante do Senhor omnisciente e omnipresente; o meio irreal pelo qual o Espírito Supremo (Brahman) Se manifesta. Não possui nenhuma existência independente de Deus, e por si não se pode considerar nem como absolutamente existente, nem como não-existente. Trata-se do Poder Divino que permite à realidade espiritual apresentar-se como mundo fenoménico. 9. O Absoluto, designado assim porque não há nada no universo, passado, presente ou futuro relacionado com Ele. A palavra significa “Majestade” .Brahman é o Eterno, o não-condicionado e a suprema Realidade, sem segundo (advaita), sem atributos, sem acção e impossível de se aproximar d’ Ele mediante palavras ou pensamentos. O Avadhut Gītā diz. «Brahman não é nem o Conhecedor, nem o Conhecido; as Escrituras (Vedas) não têm como demonstrá-lo: as palavras não podem descrever esta Consciência absoluta; ante Sua Majestade, a alma está perdida. Como poderia eu descrever-te este Eterno?» 10. Jīva – a consciência individualizada. 11. Vidente 12. Moksa – Libertação da escravidão da existência mortal juntamente com todos os seus sofrimentos e limitações, através da aquisição do conhecimento espiritual. É a destruição da ignorância (avidyā), que proporciona ao yogī a libertação do ciclo recorrente do nascimento e da morte, assim como da realização do verdadeiro conhecimento de Si mesmo. 13. Assembleia tradicional de yogīs presidida por um Mestre tradicional, na qual ensina e medita a verdade espiritual. Tradução para Português por Helena Gallis a partir da versão castelhana de: Corniero, Alejandro; El Mundo esta en el Alma, Ediciones da la tradición Unánime,1994 ![]() |
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