Por David Biello
Qual a relação entre mudanças climáticas e tornados?
Climatologista explica os fenômenos e considera a disponibilidade de água como o maior dos desafios. Um poderoso tornado de três quilómetros devastou o subúrbio de Moore, na cidade de Oklahoma, em 20 de Maio. O fenómeno apresentava ventos de mais de 300km/h enquanto destruía casas e escolas, deixando um rastro de destruição em grande escala e matando dezenas de pessoas, incluindo muitas crianças.
Oklahoma é marco zero de tornados por razões geográficas. O estado fica localizado precisamente onde o ar quente do Golfo do México colide com o frio do oeste e do norte. Muitos cientistas se perguntam se o aumento recente das concentrações de gases de efeito estufa na atmosfera terrestre – e o calor extra que eles aprisionam – intensificou esse fenómeno climático em particular, e se vai continuar a potencializando outros tornados durante a temporada, prevista para durar até agosto.
Scientific American entrou em contato com o cientista climático Kevin Trenberth, do National Center for Atmospheric Research em Boulder, no Colorado, para saber o que pensa sobre o papel do aquecimento global na indução de tornados mais fortes ou mais intensos. Em um artigo de 2007 para Scientific American, Trenberth previu que a mudança climática levaria a furacões mais intensos no Oceano Atlântico.
[Segue uma transcrição de parte da entrevista]
Eu sei que esse tipo de evento climático extremo é parte do território no centro do país, mas será que a mudança climática tornará climas extremos mais comuns ou mais prováveis?
É claro, tornados são basicamente um fenómeno climático. Eles surgem a partir de certas tempestades, normalmente tempestades supercelulares, que estão em um ambiente de cisalhamento de vento que promove rotação. Esse ambiente é mais comum na primavera, em todos os Estados Unidos, quando a rota da tempestade fica na distância certa do Golfo do México e de outras fontes de humidade.
A principal conexão com a mudança climática é através da instabilidade básica do ar baixo que cria a convecção e as tempestades. Condições mais quentes e mais húmidas são fundamentais para o ar instável. Os oceanos estão mais quentes devido à mudança climática.
O efeito da mudança climática provavelmente contribui entre 5% e 10% em termos de instabilidade e subsequente precipitação, mas ele se traduz em até 33% na potencialização de danos. (Algo altamente não-linear, para 10% é 1,1 ao cubo =1,33). Há uma cadeia de eventos. As mudanças climáticas afectam principalmente seu primeiro elo: a flutuabilidade básica do ar é aumentada. Se isso se traduz em uma tempestade super celular ou em um tornado, depende muito do clima.
Como uma contribuição tão pequena do aquecimento global se traduz em um efeito tão grande em termos de dano?
Existe um grande nível de variabilidade natural. Quando a variabilidade natural toma a mesma direcção dos efeitos das mudanças climáticas, repentinamente quebramos recordes. Nós cruzamos limiares e registamos novos extremos. Um pequeno efeito pode se traduzir em um grande impacto nessas condições. É a gota d’água que faz o copo transbordar.
Como o aquecimento afecta a flutuabilidade do ar? Eu achava que isso tinha mais relação com níveis de vapor d’água.
É a combinação de temperatura e humidade. A estrutura de temperatura vertical da atmosfera é um ingrediente crítico: adicionar mais calor e humidade adiciona flutuabilidade nos níveis mais baixos. A parte da humidade aparece principalmente quando o ar começa a se condensar, emitindo calor latente no processo. Esse calor, que vem do calor original usado para evaporar a humidade, se soma à flutuabilidade.
Dado esse potencial, porque os Estados Unidos tiveram uma ausência de tornados recentemente?
A mudança climática não altera (muito) o clima ou padrões climáticos. No ano passado tivemos condições anticiclónicas e uma redução no ar flutuante, e a corrente de jacto foi empurrada para o norte. Quase não ocorrem tempestades nessas circunstâncias. A variabilidade anual é grande, e o fenómeno El Niño tem grande importância nesse cenário. Neste ano o El Niño e a La Niña não estão em jogo, permitindo que o clima seja mais normal e variável. O padrão não está fixo como estava nos últimos dois anos (de maneiras muito diferentes).
O problema está relacionado à mudanças climáticas, ou ao desenvolvimento [humano] na rota de eventos climáticos extremos, seja no Vale dos Tornados ou em litorais expostos a furacões e coisas do género?
Sem dúvida o maior problema envolve pessoas se colocando no caminho do desastre, construindo principalmente em áreas costeiras e planícies de inundação.
O que podemos esperar no futuro uma vez que níveis cada vez mais elevados de gases de efeito estufa na atmosfera provavelmente aprisionarão ainda mais calor?
O calor tem que ir para algum lugar. Esperamos mais extremos, particularmente no ciclo da água. Secas mais fortes, maiores ondas de calor, e um risco muito maior de incêndios, além de tempestades mais fortes e chuvas mais pesadas, onde a chuva já ocorre. Administrar a água será um grande desafio.
Scientif Americam